Foram 88 anos de uma vida preenchida por muitas alegrias e tristezas, altos e baixos, mas que culminaram em 3 filhos, 6 netos e 4 bisnetas.
Ao preparar um álbum fotográfico que retratasse a sua vivência ao longo dos anos, pude ver as diferentes fases da sua vida (e da dos filhos e netos).
Tendo saído de Portugal para Angola, conseguiu construir lá uma vida desafogada para si e proporcionar um futuro aos filhos como ela nunca tinha tido.
Apesar de ter sido “escorraçada” da terra onde tinha escolhido ficar o resto dos seus dias, onde tinha investido sangue suor e lágrimas, conseguiu regressar e reconstruir uma nova vida. Mas as marcas feitas pela forma como teve de sair de Angola (com espingarda apontada e a possibilidade de em ½ hora trazer uma mala e nada de jóias ou dinheiro ou algum bem material) ficaram para sempre gravadas nela.
Já na segunda metade da vida, conseguiu superar a morte do meu irmão (o seu afilhado), a doença prolongada do meu avô e o seu falecimento, a separação da minha mãe e o divórcio do meu tio, o afastamento da família, o cancro da minha madrinha, e tantos, tantos outros problemas de saúde que a afectaram ao longo dos anos.
Sempre tentou ajudar os filhos e os netos (muitas vezes até acima das suas reais possibilidades) e sempre tentou tirar o maior partido do que tinha.
Com uma fé inabalável, quem lhe tira os seus padres, freiras, religião, orações, igrejas… tira tudo!
É teimosa e casmurra (mas esse é um sinal de família, tal como o queixo grande), mas “adopta” campas no cemitério onde vai regularmente ver o meu avô, ajuda as freiras, a igreja e “cansa” os seus santinhos de tantas orações e pedidos para a sua família.
Adoro ver como se “faz de parva” e sempre vai conseguindo saber aquilo que os filhos lhe querem esconder para a “proteger”. E adoro o facto de ser uma mulher muito mais forte do que a sua frágil imagem deixa perceber!
O álbum que lhe preparei foi um trabalho muito duro, prolongado, cansativo, mas que me permitiu conhecer melhor a minha avó e a minha família, até pelas fotos que me enviaram para incluir no álbum!
No início achei que ter trabalhado todas estas fotos para as colocar numa moldura digital, seria um trabalho “ingrato” e talvez fosse muita tecnologia para ela, mas hoje acho que foi uma excelente ideia. Até porque não me posso esquecer que a minha avó sabe trabalhar com o telemóvel (e ler sms e tudo), com o leitor de dvd e que adora mexer em botõezinhos.
E a cara dela quando começou a ver as fotos?!
O prazer de rever os pais dela, os dias em Angola com o meu avô e com os filhos e netos pequeninos, a família a crescer até chegar às bisnetas!!!
Como a moldura vem com um comando que lhe permitirá mudar de foto todos os dias, vai ficar horas a ver as fotos. Aliás, com as centenas de fotos que incluí, pode até mudar de foto de manhã à tarde e à noite que terá sempre uma foto diferente para ver!
Valeram a pena os dias sem dormir a preparar as fotos, o esforço e o cansaço da viagem para a Guarda, só para ver a cara de felicidade quando nos viu chegar para partilhar com ela este dia tão especial. E a felicidade com que começou a ver as fotos do álbum e mandava parar quando aparecia uma foto antiga e nos explicava quem era, ou perguntava onde estava determinada foto de determinada época!
Quanto à sua festa de anos, só posso dizer que foi um dia muito bem passado, com um EXCELENTE almoço feito pela minha madrinha, com a presença do meu
A felicidade dela ao ver o bolo (aquela é a foto preferida da família e que ilustra bem a boa disposição e o bom humor dela, especialmente ao agarrar numa garrafinha de … Alma), ao ter à sua volta uma parte da família, ao abrir as prendas (é bem verdade que de velho se volta a menino) são coisas que não se podem pagar, nem se vão apagar da memória de quem lá esteve tão cedo!
Adorei estar com todos, adorei ver o dinamismo da minha avó, invejei-lhe a idade, a família e o que construiu e só espero que para os seus 99 anos consiga fazer um trabalho mais perfeito, mais bonito, e que todos estejamos juntos - porque a minha avó é a pedra que ainda vai reunindo a família à volta dela e merece um esforço da parte de todos.
Pessoalmente, continuo a sentir pena de não se ter conseguido reunir toda a família para esta celebração, pois tenho a certeza que seria um dos momentos mais felizes dos últimos anos para a minha "velhota" querida, mas pode ser que no futuro se consiga.
Devo salientar que a minha avó tem uma osteoporose em estado muito avançado, mas não deixa que isso a impeça de viver a sua vida independente e de estar na sua casa (mesmo ficando mais pequenina e curvada a cada dia que passa). E apesar disso e de todas as alergias e maleitas de que sofre (real ou menos real)... a cara, o sorriso, a alegria... são sempre as mesmas ao longo dos anos!!! Nada a impede de parecer cada dia mais nova, mais sorridente, com um aspecto que não mudou nada nos últimos anos (ok, está mais pequenina, mas é só).
Não sei se são os seus santinhos, as suas rezas, os seus adorados padres, freiras e afins que a ajudam a manter a sua vitalidade apesar dos percalços que a vida lhe colocou, mas a verdade é que vai sobrevivendo e rejuvenescendo a cada dia.
Para mim, a minha avó (se lhe tirar a parte das orações, rezas e adoração pelos padres, e tirar também as ideias muito conservadoras sobre o papel das mulheres no casamento, a adoração a Salazar e mais uns pequeninos defeitos), é uma das pessoas que mais admiro e que me serve de exemplo para muita coisa, pela sua coragem, determinação e amor incondicional à família.
Acima de tudo, espero chegar a esta idade e conseguir ter realizado metade das coisas que a minha avó realizou e ter a família que a minha avó conseguiu ter, pois é uma das coisas que mais “invejo” e admiro na minha adorada “velhotinha”!
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