sexta-feira, 11 de abril de 2008

Amar demais

Segundo o Wikiquote, o Amor é:
"É complicado, atordoante, te vira completamente do avesso, mas encontrar a pessoa que te completa é a melhor sensação que alguém pode ter. É como se fosse um encontro consigo próprio, e como tal, é claro, amedronta, faz você repensar toda sua vida, e você descobre que não era nada antes de conhecer o verdadeiro amor, e que, depois dele, você já era, está aniquilado se não tiver mais, mesmo que por um dia, sua alma especial ao seu lado."
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Patricky Field
Desde ontem, e de uma conversa que tive à noite, que penso no que é o Amor, e acima de tudo o que é Amar Demais.
No caso de não saberem, Amar Demais já é considerado uma doença, e há alguns anos que é considerado um vício, como o álcool, as drogas, o tabaco e tantos outros vícios.
Apesar de existirem grandes debates sobre este tema, pois Amar Demais alguém pode ser derivado de uma baixa auto-estima, necessidade de controlar, etc... etc... a verdade é que todos nós conhecemos de certeza casos assim (eu sou um caso assim... ou fui).
Há um artigo muito bom, publicado no Público de 7 de Março de 2008 (e que poderão igualmente ver na revista Pública de 16 de Março, ou carregando por cima do link), onde há alguns comentários de psicoterapeutas, e em que se fala exactamente neste tipo de relação.
Muitas vezes as mulheres (e infelizmente eu identifico-me com este tipo de amor... em alguns aspectos...) que sofrem deste "distúrbio" procuram homens problemáticos, que as ponham constantemente à prova, distantes, egoístas... em que elas tenham de lutar pela relação e vivem num estado de paixão em que acreditam que não podem sobreviver sem essa pessoa (aqui já não sou eu). Ao fim de algum tempo as relações acabam, porque a pessoa se sente vazia, anulada como pessoa, cansada...
Mas há outras que não conseguem largar essa dependência, que se anulam como pessoas e como indivíduos, passando a viver em função do outro.
Ao ler este artigo, tive curiosidade de ir ver o que era a MADA e como funcionava.
É um grupo de origem brasileira, mas que foi formado em Portugal, para ajudar as mulheres portuguesas. Existem dois locais onde podem procurar a informação:
Nos sites apontam mais curas e passos... mas o que eu gostei de ler foi o artigo do Público. E os comentários do Dr. Aníbal Henriques, com os quais me identifico bastante:
Para Aníbal Henriques, os grupos de auto-ajuda são muito importantes numa primeira fase, chamada de reconhecimento e partilha do problema, mas dificilmente levam a uma alteração efectiva de algumas situações mais complexas. “A mudança implica muitas vezes uma concorrência de factores que nem mesmo a psicoterapia, com todos os seus instrumentos desenvolvidos ao longo de mais de cem anos, pode garantir.” “Desde que o grupo de auto-ajuda não prometa mudanças que não está em condições de oferecer, poderá ser muito benéfico porque permite problematizar temas relevantes sem a chancela estigmatizante da psiquiatria. Todos estamos sujeitos a crenças relacionais de que não temos consciência e é necessário identificar e desactivar estes processos mentais para que se possa falar num processo de mudança ou ‘cura’”, te) que Amar Demais é algo que não existe. O que existe é amar de uma forma doentia, desajustada. Existe mesmo um grupo de ajuda, no estilo dos AA, para este tipo de comportamentos (está referenciado no artigo, chama-se MADA - Mulheres que Amam Demasiado Anónimas), e em que se explica que o nome foi adoptado para não criar nas pessoas um estigma , ou ser associado a algum tipo de patologia redutora.

Estamos todos sujeitos a ideias pré-concebidas e mesmo inconscientes da relação que queremos colocar em prática. O equilíbrio consiste em ir ao encontro do outro, sem o perder nem me perder a mim próprio”
“É um tango delicado. Dançar de forma agradável para o outro sem o pisar não é nada fácil”

Aníbal Henriques afirma que algumas perturbações associadas a este tipo de queixas relacionais podem durar a vida toda ou décadas, dependendo de diferentes variáveis como a presença ou ausência de outros problemas, a estabilidade familiar e contextos sociais, amorosos e relacionais de cada indivíduo. Contudo, deixa a ressalva: “nem sempre podemos falar em doença até porque todos, em algum momento da nossa vida, ‘amamos demais’, amamos de forma errada, queremos receber do outro não o que este nos dá mas o que necessitamos receber. É uma condição inerente às relações humanas
E fiquei a pensar nas minhas relações... nos casos descritos no artigo... e em que eu podia sentir semelhanças na minha vida.
Não considero que seja uma pessoa que Ama Demais, ou que seja dependente disso - não no sentido de doença ou patologia. Não tenho problemas em viver sem amor, nem sou daquelas pessoas que tem medo de ficar sozinha. Nesta idade já passei essa fase (acho que nunca a tive...).
Mas reconheço que escolho sempre e sou apaixonada pelas pessoas mais erradas para mim! Quanto mais diferente for de mim... melhor! Procuro uma pessoa que me complete... e acabo sempre com uma com que choco!
O meu primeiro e grande amor... foi realmente um caso de Amar Demais. Foi uma relação doentia, errada, em que me anulei como pessoa e anulei a minha personalidade para passar a viver em função dele.
Não foi imediato... foi um processo gradual ao longo dos anos.
Mas a verdade é que descobri, passados 6 anos de relacionamento, que estava com uma pessoa que tinha deixado de me apoiar, que sabia que eu estava ali (bastava estalar os dedos), me tinha isolado dos meus amigos e colegas, detestava que eu jogasse pólo aquático (a minha grande paixão) e raramente me apoiava ou ia ver algum jogo, etc.... Chegamos ao ridículo de eu ter faltado à minha própria festa de anos, pois ele não gostava dos meus colegas de equipa e amigos que lá estavam (alguma coisa pode ser mais patética? Por acaso tenho outra... mas fica para mim).
Mas mesmo tendo anulado a minha personalidade, mesmo sendo uma "dependente" daquela pessoa (que ia de férias sozinho e se esquecia que eu existia, que me traía...)... acho que cheguei ao ponto de descobrir que quem eu devia amar era eu e não ele. Descobri que não precisava de ficar dependente de alguém que me amasse... que não era assim tão desinteressante que só uma pessoa me podia acabar.
Foi duro, mas consegui acabar com a relação... manter a decisão... e passar um ano de merda (desculpem a expressão), sempre com as dúvidas sobre ter tomado a boa decisão ou não - até perceber que realmente foi a melhor decisão da minha vida!
A melhor parte foi a altura em que a tomei - passagem de Ano! Algo que nunca me disse nada e durante aqueles 6 anos significava ir para o Algarve apanhar grandes bebedeiras (o que era complicado, pois eu era sempre quem não bebia para levar os meninos a casa). Quando chegou a meia-noite e ele , podre de bêbado, veio ter comigo e perguntar o que eu tinha desejado para o ano novo... a minha resposta foi "O que desejo vai ser já realizado - está tudo acabado entre nós!". Como ele não estava em condições de perceber... levei-o até casa (mais os amigos)... e enquanto curavam a bebedeira, fiz a mala, andei 4km até à estação de comboios e vim embora.
Foi talvez a decisão mais difícil da minha vida (é sempre difícil sair de uma obsessão, de um vício)... e ele tentou contestar durante mais de 2 meses... mas se eu tivesse sido esperta, 6 anos antes, quando no fim do primeiro mês eu percebi como ele era e lhe disse que queria acabar... em vez de aceitar continuar, porque ele recusou e me disse que era comigo que queria estar.... tinha acabado mesmo. Mas mais uma vez... a razão ficou cega pela "porcaria" do coração e da ingenuidade de acreditar que as pessoas mudam. Ele "mudou"... durante 3 anos... até ao fim da faculdade... e depois saiu da casca. Mas nessa altura já eu era dependente...
Hoje em dia sei que sim, sei que foi a melhor decisão da minha vida... mas a dor de aquele amor não ter resultado estará sempre presente.

E depois passei dessa relação, em que eu vivia para a pessoa... para outra relação em que estava com uma pessoa que, sentia eu, vivia para mim.
Ele era o ideal de qualquer mulher - um homem que me amava (com todos os meus defeitos e legendário mau feitio), que fazia tudo por mim, carinhoso, sempre presente, sempre disponível, que partilhava os mesmo gostos e paixões que eu...
E o que aconteceu... senti-me sufocar! Senti que estava a ser idolatrada e que tinha uns pés de barro muito frágeis, senti que estava a perder o controle da minha vida... que não conseguiria viver de acordo com as expectativas de uma pessoa que me amava assim...
Tal como no caso relatado no artigo do Público... senti que ele estava presente demais. Faltava aquela "luta" pela relação, aquela paixão que deve ser sempre incerta, pela qual se deve "lutar".
Com ele percebi o que o meu primeiro amor devia ter sentido na nossa relação (e como é difícil viver uma relação assim - pelo menos para mim). Quando há a certeza que a outra pessoa está ali... começa-se a perder o interesse... quando a pessoa está sempre presente... é tudo aquilo que se espera, está sempre com surpresas, ofertas, ... não sei... faltou-me o ar. Começou a faltar o chão... comecei a imaginar o futuro... comecei a afastar-me... e, mesmo gostando dele, mesmo sendo a pessoa que sempre esteve a meu lado e com quem gosto de estar (ainda hoje)... tive de me afastar!
Se o magoei? Sei que sim! Muito! Ainda hoje ele não percebe o que aocnteceu e eu não lhe consigo explicar concretamente... acho que foi um acumular de situações.
Covardia? Penso que não... penso que estar numa situação assim seria muito complicado para mim e que ia ser muito pior persistir na relação.
Por mais que procure o meu príncipe encantado... sempre precisei da minha independência... e quando ele não conseguiu aceitar que eu tivesse o meu espaço, a minha casa (a minha bóia de salvação)... percebi que não conseguiria viver assim!

Dizem que as mulheres nunca gostam de quem as trata bem e só procuram quem as magoa, quem as trata mal... Gostava de pensar que não é o meu caso (apesar de as provas recentes dizerem o contrário).
Mas acho que tem de haver espaço para os dois existirem como pessoas. Não se pode viver em função da outra pessoa, por muito que se ame!
Não se podem controlar todos os seus movimentos, exigir toda a sua atenção. Fazer tudo em conjunto!
Tem de se chegar ao compromisso, comunicar (muito gosto eu deste termo!), e aceitar que devem viver vidas separadas, com um espaço comum. Adoro a expressão de que num casal deve existir espaço para o EU, o TU e o NÓS!
Conheci um casal, quando trabalhava em Marselha, que por vezes até enjoava... eram apaixonadíssimos e estavam casados há 3 anos. Onde estava um estava sempre o outro, sempre com carinhos e cuidados um com o outro. E eu pensava - que sorte, encontraram-se 2 almas gémeas (quem me dera ter alguém assim comigo). Ao fim de algum tempo, comecei a "enjoar" de tanto amor, e comecei a pensar mais cinicamente se tantas provas de amor não seriam uma forma de se enganarem um ao outro. De pensarem que estavam loucamente apaixonados. De se convencerem da força do amor deles. Uma espécie de doença de Amar Demais mútua. O que lhes aconteceu? Não chegaram ao 5º aniversário. Divorciaram-se antes. Ela conheceu outra pessoa... que lhe dava mais luta... que não estava certa e segura... que lhe dava individualidade.
Por isso sempre acreditei que a vida de casal devia ser feita por 2 pessoas, com os seus espaços, que compartilhavam um espaço comum. Cada um com a sua vida, e que estavam juntos por opção e não por obrigação (a de estarem juntos por serem um casal). Cada um com os seus gostos, com as suas paixões e hobbies. Se partilharem alguns deles - PERFEITO! É o ideal.
Quererem partilhar com o outro - é Excelente. Mas perceberem que o outro pode preferir estar sozinho a fazer algo - É o IDEAL!
Fica a dúvida... serei uma pessoa que deve ir à MADA, ou simplesmente alguém que ainda não encontrou a pessoa certa?
Devo procurar um homem que me Ame a mim, sempre presente?
Ou um homem que seja independente... mas sempre presente quando necessário? Que goste de fazer as suas coisas, mas que me dê espaço para partilhar com ele, se quiser?
Sim, porque eu preciso de espaço. Lanço-me de cabeça da minha nuvem... e procuro sempre apoio, carinho, atenção... mas quando estou pior... preciso de estar sozinha. Não posso ter um homem presente que insista para que partilhe tudo. Sem pressões acabo por partilhar... com elas... acabo por me afastar.
E com esta longa divagação... fica novamente a dúvida... serei uma MADA?
Ou simplesmente alguém que Ama incondicionalmente e cegamente?

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